Cultura e Antropologia

Dentre as Ciências Humanas, a disciplina que mais se especializou em estudar a cultura ou os fenômenos culturais ao longo do tempo é a Antropologia Cultural ou Social. A palavra “antropologia” deriva do grego anthropos, que quer dizer “homem” (no sentido de espécie, e não de sexo) ou “humano”.

Ao contrário de outros ramos da Antropologia que estudam o ser humano como entidade biológica e espécie natural, a Antropologia Cultural ou Social se especializou no estudo do ser humano como um animal produtor de sistemas simbólicos, isto é, como um ser enredado desde o seu nascimento em uma teia de significados que: (1) é socialmente construída; e (2) dá sentido ao mundo e molda os comportamentos de acordo com padrões específicos.

Logo, para os antropólogos, a cultura de cada pessoa confunde-se com esta “teia” ou “filtro” de significados herdados pela tradição, apesar de seu caráter mutável e transformável ao longo do tempo. Neste sentido, poderíamos compreender a cultura como um grande repositório de símbolos, valores, padrões, etc., através dos quais organizamos nossa vida, e que nos permitem, na grande maioria dos casos, dotar o mundo e nossas vivências de significado, assim como estabelecer relações sociais duráveis e estáveis com outros indivíduos que compartilham deste mesmo “filtro” ou “teia”.

Além disso, os antropólogos entendem que a cultura sempre se declina no plural. Isto porque, embora todos os seres humanos sejam dotados da capacidade de produzir cultura e se orientar culturalmente, a expressão dessa capacidade varia conforme o tempo e o espaço. Assim, podemos falar de diferentes culturas interagindo e trocando influências umas com as outras, bem como de conflitos culturais entre gerações de uma mesma sociedade (no que diz respeito aos papéis de gênero e o lugar de homens e mulheres na estrutura social, por exemplo).

Sob outro aspecto, os antropólogos enfatizam a interdependência entre fatores naturais e fatores culturais sobre o comportamento de indivíduos e sociedades. Quanto a isso, entendem que tudo aquilo que fazemos possui um aspecto biológico e instintivo e um aspecto cultural e histórico em permanente associação. Dizendo de outra maneira, parte do que somos provém do processo, da evolução natural e da nossa interação como organismos biológicos em um ecossistema. Outra parte, no entanto, surge do processo social de aprendizado e transformação cultural que se dá em um ambiente construído.

Por exemplo: a necessidade de se alimentar ou de se abrigar (do frio, do calor, da chuva, etc.) é algo natural do ser humano. Se não o fazemos, morremos – ou, no mínimo, ficamos severamente debilitados. No entanto, o modo como nos alimentamos e nos vestimos é construído socialmente dentro de uma tradição, baseado em valores e representações sobre o puro e o impuro, o masculino e o feminino, entre outras formas de classificação e ordenação da realidade.

Ora, não há qualquer razão natural para que meninos prefiram a cor azul e meninas prefiram a cor rosa, mas isto parece “natural” para grande parte da nossa sociedade porque o aprendizado cultural do significado das cores ocorre desde cedo, formatando nossa apreciação visual, valores estéticos e preferências de gênero. Da mesma maneira, causa estranhamento a muitos ocidentais o hábito de alguns povos asiáticos e africanos comerem cachorros, cujo estatuto moral em nossas sociedades é quase o de membros da família. Por outro lado, comer carne de vaca provoca o mesmo tipo de sentimento entre os praticantes da religião hindu, que consideram este animal sagrado e evitam seu consumo.

Por fim, ao contrário do que normalmente ocorre no senso comum, os antropólogos já deixaram há muito tempo de acreditar que podemos falar de culturas “superiores” ou “inferiores”. Quando muito, podemos falar de culturas de maior ou menor escala demográfica (a cultura norte-americana em contraste com a cultura dos índios bororo do Brasil Central, por exemplo), com maior ou menor sofisticação de seu aparato técnico. Não raro, culturas aparentemente muito simples do ponto de vista tecnoeconômico, que, para nossos padrões, viveriam apenas para sua subsistência, possuem sistemas de parentesco e estruturas mitológicas muito complexas, cuja lógica interna exige dos antropólogos o auxílio de matemáticos e computadores de alta precisão para ser decifrada.

No próximo post, veremos como todos estes pressupostos são empregados pelos antropólogos no estudo dos fenômenos culturais.

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