Sócrates

No período clássico, há um deslocamento de interesses e emergem figuras importantes da sociedade grega: os sábios, também conhecidos como sofistas. Herdeiros de uma rica tradição literária e cultural, os sofistas se tornam os professores da pólis e, com habilidade de retórica, passam a discorrer sobre problemas que já não dizem mais respeito à natureza do mundo, mas ao homem, seus valores e suas relações com a sociedade. Um proeminente pensador grego, Protágoras de Abdera (485-411 a.C.), disse que “o homem é a medida de todas as coisas”. Nesta frase, “o homem” não deve ser tomado por um gênero ou uma raça, mas por um indivíduo. Com essa afirmação, Protágoras marca o relativismo próprio da sofística: a verdade é conforme a consciência de cada um, ou seja, a verdade de um pode não ser a verdade de outro. Os sábios
utilizavam a retórica para convencer os demais de sua própria verdade. O discurso vale menos por ser verdadeiro ou falso e mais por ser um instrumento de pacificação, de consenso político e social. O bom discurso não é aquele que reflete mais adequadamente a realidade, mas sim aquele que tem mais capacidade de convencimento e persuasão.

Sócrates (470-399 a.C.) – Só sei que nada sei

O que se tem registrado sobre a filosofia de Sócrates está nas obras de dois de seus discípulos, Platão e Xenofonte. O primeiro o descreveu, protagonizando os diálogos socráticos, como o filósofo de um poderoso e combativo método de investigação. O segundo, como mais um sofista. O Sócrates que adquire relevância histórica, portanto, é aquele cujas ideias estão descritas nos diálogos de Platão.

Como acabamos de ver, a cena cultural grega havia sido tomada pelos sofistas e você ainda deve ter notado, pelas teses dos pré-socráticos, que a Filosofia tem um movimento pendular, ou seja, que as teses que adquirem importância acabam resultando em uma tese oposta. E foi neste contexto da Grécia sendo influenciada pelo relativismo dos sofistas que o pêndulo da história deu início ao seu movimento no sentido contrário. Sócrates rompe com os sofistas ao buscar uma referência para a verdade que não seja subjetiva, que não varie de pessoa para pessoa.

Para atacar o relativismo sofista, Sócrates não pode simplesmente oferecer a um interlocutor uma tese distinta da que este lhe apresenta, porque a situação resultaria numa disputa retórica de duas verdades. Sócrates, ao perguntar o que é a bravura, assume a postura de quem, de fato, não sabe o que é a bravura. Sua certeza é a de não saber, e, aos poucos, pelo seu método de perguntar ao interlocutor o que é determinado valor, mostrará que também seu interlocutor, embora cheio de certezas e autoridades, não sabe. Mostrará, ainda, que o bravo, embora pratique e exerça a bravura, não tem o critério da bravura.

O método socrático consiste no seguinte esquema:

► Sócrates pergunta o que é determinado valor.

► Seu oponente responde com uma definição ou um exemplo.

► Sócrates acata a definição e em seguida apresenta um caso daquela definição ou exemplo que contém características que impeçam o próprio oponente de aceitar que aquilo que está sendo dito seja o valor que ele havia apresentado.

► A partir daí, formula-se uma nova tentativa de definir o valor.

► Sócrates, irônico, novamente aceita, mas apresenta novo contraexemplo.

► Assim, a cada movimento do diálogo, o sábio desafiado por Sócrates vai tendo seu suposto conhecimento esfacelado.

A filosofia de Sócrates tem, então, uma implicação ética interessante: o erro moral se torna um erro intelectual. É por não saber quais são os critérios dos valores que os homens erram. Além dessa consequência moral, há uma consequência epistemológica: ao contrário do que dizia Protágoras, o critério se impõe ao homem como critério, e a medida de determinado valor é o próprio valor, e não o homem. O erro é ignorância e saber é poder. Com isso, suas ideias têm ainda um forte impacto político: se saber é poder, nem todas as pessoas possuem o mesmo poder. Com Sócrates, inicia-se então um movimento que ataca alguns dos princípios da democracia grega, incorporando o saber à escolha do político.

A noção de ética (ethos), outra das áreas temáticas da filosofia, sofreu uma distorção à medida que as sociedades modificaram sua forma de se organizar. Hoje, associamos a ética às ações do homem em seu convívio social, mas, na sociedade grega do período clássico, a ética estava relacionada ao bem viver e à virtude pessoal.

Epistemologia é o estudo (logia) do conhecimento (episteme) e uma das áreas mais exploradas da filosofia de tradição analítica nos dias de hoje.

A filosofia política (politikos) trata das instituições que ordenam nossa vida em sociedade.

Na democracia ateniense, os cargos políticos eram determinados por sorteio. É preciso ter em mente que este processo democrático excluía mulheres, escravos, estrangeiros e todos aqueles que não tivessem sua liberdade econômica. Mas, se a escolha do médico para tratar o enfermo se dá pelas suas competências e habilidades em curar os doentes e se a escolha do general se dá pela sua capacidade de guerreiro e estrategista, porque então os assuntos administrativos da Pólis podem ser relegados ao acaso?

Ao propor que o critério do líder político seja o saber, um saber que pode ser adquirido por qualquer pessoa, Sócrates está afrontando a própria organização de classes da Grécia e é esta afronta que será decisiva para que o acusem de impiedade em um tribunal que o condenou à morte.

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