Ao longo da história, após Lineu e a teoria evolutiva, diversas escolas de pensamento defenderam diferentes critérios para classificar os seres vivos. A despeito disso, atualmente, a sistemática utilizada na biologia é a Sistemática Filogenética. Não se assuste com esse nome. Filogenias são representações de histórias evolutivas entre os organismos. Como comentado no começo do texto, os organismos possuem uma história evolutiva. Todos os seres vivos conhecidos possuem um ancestral comum, como você, sua irmã e seu primo. Assim, a sistemática filogenética vai classificar os organismos de acordo com suas relações de parentesco. Apesar da novidade, a sistemática filogenética vai utilizar a nomenclatura binomial e as categorias taxonômicas de Lineu. Entretanto, vai fazer isso dentro da perspectiva das relações de parentesco. Assim, espécies que são classificadas dentro de um mesmo gênero devem ser mais aparentadas entre si do que com espécies colocadas em outro gênero. Gêneros de uma mesma família devem ter relações mais próximas em termos evolutivos do que com gêneros presentes em outra família, e por aí vai!

Olha para a figura acima. Canis latrans e Canis lupus são parentes mais próximos entre eles do que de Lutra lutra. Assim, baseados nas relações de parentesco e dentro da perspectiva da sistemática filogenética, não poderíamos colocar Canis latrans no gênero Lutra e manter Canis lupus no gênero Canis. Essa classificação não levaria em conta as relações de parentesco. Perceba, então, que as filogenias são a base para as propostas de classificação atuais. Outro nome para uma filogenia é árvore filogenética. Existe essa ideia de “árvore” porque, nessas representações, as linhas vão se bifurcando, como se fossem ramos ou galhos. Vamos entender melhor como interpretar uma árvore filogenética. Preste atenção na figura a seguir. Nessa árvore filogenética, estão sendo mostradas as relações de parentesco de cinco espécies de grandes primatas. Além das relações de parentesco, nessa filogenia também está colocada a escala de tempo. Note que as cinco espécies possuem um ancestral comum que viveu entre 15 e 10 milhões de anos atrás. Cada ponto de ramificação pode ser chamado de nó. Esses nós representam os ancestrais comuns. Perceba que chimpanzés e bonobos possuem um ancestral em comum que não compartilham com os demais. Da mesma forma, essas duas espécies e os seres humanos compartilham um ancestral que não é ancestral dos demais. Duas espécies mais próximas, como chimpanzés e bonobos nessa filogenia, são chamadas de espécies irmãs.

Outro termo muito importante é clado. Um clado é um grupo formado pelo ancestral comum e todas as espécies que descendem desse ancestral. Assim, na imagem anterior, chimpanzés e bonobos, juntamente com seu ancestral forma um clado. Chimpanzés, bonobos e humanos também formam um clado.

Quem é parente mais próximo de humanos? Chimpanzés ou bonobos? A resposta é ambos. Perceba que é possível “girar” os nós das filogenias sem alterar a relações de parentesco representadas. Tanto na filogenia A como na filogenia B da imagem, chimpanzés e bonobos são parentes mais próximos porque compartilham um ancestral comum mais recente. Esse ancestral não é compartilhado com os humanos.

Já sabemos que o objetivo da sistemática filogenética é esclarecer as relações de parentesco, ou seja, mostrar os clados que existem. Então, outro nome para sistemática filogenética é cladística. Da mesma forma, as filogenias/árvores filogenéticas podem ser chamadas de cladogramas. Nos cladogramas, os clados mostram um ancestral comum e todos os seus descendentes. Esse tipo de grupo é chamado de grupo natural, ou monofilético. Todos esses nomes — clado, grupo natural e grupo monofilético — representam a mesma coisa: grupos que englobam todas as espécies e seu ancestral comum. Existem diversos grupos, principalmente formados faz muito tempo, antes das ideias evolutivas, que não são grupos naturais. Exemplos desses tipos de grupos são o parafiléticos e polifiléticos. Veja na imagem ao lado que os grupos polifiléticos possuem descendentes de ancestrais independentes. Um grupo formado por aves e mamíferos, animais endotérmicos, seria um grupo polifilético. Já os grupos parafiléticos incluem os descendentes de um ancestral, mas não todos os descendentes. Veja na imagem abaixo que o grupo parafilético formado exclui a espécie A. Já os grupos monofiléticos englobam o ancestral e todos os seus descendentes.

Um exemplo clássico de grupo parafilético são os répteis. Apesar de incluir vários descendentes de um ancestral comum, os répteis não incluem as aves, que também possuem esse ancestral. Por isso, répteis não formam um grupo monofilético. Veja na imagem a seguir.

Outra questão interessante que envolve as aves é que elas são parentes próximas de um grupo de dinossauros chamados de saurisquianos. São até mesmo mais aparentadas com esse grupo do que esse grupo é com outros dinossauros conhecidos como ornitisquianos. Assim, se você classifica esses dois grupos como dinossauros, as aves também precisam ser consideradas dinossauros. Ou você formaria um grupo, parafilético. Seria parecido com o exemplo de colocar você e seu primo em um grupo mas não incluir sua irmã. Assim, podemos dizer que os dinossauros não foram totalmente extintos. Porque as aves são dinossauros!

Mas como a galera da sistemática faz pra saber quem é parente mais próximo de quem? Ou seja, qual o método que se utiliza para construir as árvores filogenéticas? Isso vai ser feito buscando características compartilhadas pelos organismos por causa de herança evolutiva. Essas características são chamadas de homólogas. Vamos definir isso melhor, porque é muito importante. Características homólogas são aquelas compartilhadas por uma ou mais espécies porque foram herdadas de um ancestral comum. Essas características vão ajudar a reconstruir as histórias evolutivas. Elas podem ser de diversos tipos, como morfológicas, anatômicas, moleculares, fisiológicas ou mesmo comportamentais. De forma geral, as mais utilizadas para as filogenias são as morfológicas e moleculares. Olhe para o cladograma abaixo. Perceba que, ao longo do cladograma, existem características sendo mostradas, como os “vasos condutores”. A presença de vasos condutores é uma característica presente no ancestral e que foi herdada por todos os descendentes. Assim, angiospermas, pteridófitas e gimnospermas, possuem vasos condutores, que não estão presentes em briófitas. Você pode exercitar esse raciocínio olhando as demais características apresentadas para saber quais grupos as possuem. Quem tem sementes? Quem tem flores e frutos?

Note que “embriões” é uma característica presente em todos os organismos mostrados. São essas características homólogas compartilhadas, novidades evolutivas, que nos ajudam a reconstruir as histórias evolutivas. Esse tipo de homologia é chamado de apomorfia (são caracteres derivados que diferem da condição ancestral). Como a apomorfia “embrião” é compartilhada por diferentes grupos, ela é chamada de sinapomorfia. Os caracteres ancestrais são chamados de plesiomorfias ou simplesiomorfias quando são compartilhados. Se uma característica é uma sinapomorfia ou uma simplesiomorfia, vai depender da “escala” dentro do cladograma. Para alguns grupos, certas características vão ser sinapomorfias e, para outros, essas mesmas vão ser simplesiomorfias. Por exemplo, pensando em vertebrados, membros anteriores modificados em asas poderiam ser considerados como uma sinapomorfia das aves. Entretanto, pensando nas relações de parentesco das aves, essa característica é uma simplesiomorfia compartilhada por todas elas. Apenas as sinapomorfias podem ser utilizadas para esclarecer as relações de parentesco. Como assim?! Pense, podemos dizer que a modificação dos membros anteriores em asas agrupa diversos organismos como “aves” e ajuda a entender que esse grupo possui um ancestral comum mais recente que não é ancestral de outros vertebrados. Agora, dentro de aves, os membros anteriores modificados em asas não nos ajudam a esclarecer as relações de parentesco porque todo mundo tem! Precisamos estudar outras características para saber suas relações.
Até aqui, falamos de poucas características sendo utilizadas para construir os cladogramas. Mas, na prática, os biólogos utilizam muitas características para reconstruir as árvores filogenéticas. Cada uma das características pode ser entendida como uma hipótese de homologia. Essas características são organizadas em matrizes de dados e analisadas para gerar os cladogramas, que, por sua vez, representam uma hipótese de relações de parentesco. Obviamente, como uma hipótese, pode ser testada a partir de novos dados e, conforme novas evidências surgem, relações de parentesco podem ser revistas. Preste atenção na matriz abaixo e no cladograma derivado da mesma.

Na matriz, em um eixo temos os caracteres analisados, como “coluna vertebral”. No outro eixo temos os táxons analisados, como “tartaruga”. A matriz vai informar quais os táxons apresentam determinados caracteres. Nesse exemplo, os táxons que apresentam certo caractere são codificados como “1”. Assim, como apenas leopardo apresenta “pelo”, apenas ele vai receber o valor “1”. Veja que cada um dos caracteres representa uma possível homologia. Então, ovo amniótico, por exemplo, é uma homologia que nos ajuda a entender que “tartaruga” e “leopardo” formam um grupo natural. Essa característica é, portanto, uma sinapomorfia de tartarugas e leopardos. Você deve ter reparado que, na imagem, o anfioxo é chamado de grupo externo. O grupo externo é um grupo que ajuda a estabelecer de que forma ocorreram as mudanças nos caracteres ao longo da evolução dos táxons estudados. Assim, pegando o exemplo da “mandíbula articulada”, o anfioxo serve para saber que o estado anterior era de uma mandíbula não articulada e que ocorreu alguma mudança no ancestral de atuns, salamandras, tartarugas e leopardos que articulou a mandíbula.
Agora que sabemos como os cientistas fazem para classificar os seres vivos, com sua enorme diversidade de espécies, vamos ver um aspecto que varia entre os seres vivos e possui grande importância: as diferentes estratégias utilizadas para a reprodução.