Segundo Reinado – Política Interna

Conforme visto, o contexto em que se iniciou o Segundo Reinado é marcado pela instabilidade política e pela realização do Golpe da Maioridade (1840). Dito isso, é importante mencionar para vocês que, devido à diversidade de assuntos presentes nesse período, dividiremos o presente capítulo em: a) Política Interna; b) Transformações sócio-econômicas; c) Política Externa; d) Abolicionismo; e) Crise do Império e fim da monarquia.

Política Interna

Considerando que D. Pedro II era visto pelas elites como forte o suficiente para garantir a ordem social e sufocar as rebeliões regionais, veremos, a partir de agora, aspectos relacionados à política interna do Segundo Reinado.

LIBERAIS E CONSERVADORES: A partir de 1837, os liberais moderados dividiram-se em duas alas – a progressista e a regressista -, as quais, a partir de 1840, deram origem aos partidos: Liberal e Conservador. Os liberais – também chamados de luzias1 – eram os profissionais liberais urbanos e os produtores rurais que produziam para o mercado interno, ao passo que defendiam uma maior descentralização política do Império. Os conservadores – também conhecidos como saquaremas2 – representavam os proprietários rurais que abasteciam o mercado externo, os grandes comerciantes e, ainda, uma parcela dos burocratas do serviço público, ao passo que advogavam por um governo imperial forte e centralizado (COTRIM, 2012, p.480). Apesar dessas diferenças, ambos os partidos compartilhavam importantes semelhanças, as quais podem ser identificadas no excerto abaixo:

“As elites brancas entenderiam a corte como um clube, onde conviviam os sócios sortudos […] luzias e saquaremas […] partilhavam a mesma origem social; formação educacional em Coimbra; carreira voltada para a medicina e em especial para o direito […] Divididos por ideias que privilegiavam ora a centralização do Estado ora a sua descentralização, fechavam, porém, em uníssono quando o negócio implicava manter a escravidão e a estrutura vigente. A elite brasileira de então poderia ser caracteriza ainda como uma “ilha de letrados num mar de analfabetos” (SCHWARCZ e STARLING, 2015, p.280).

1 Apelido provavelmente associado à cidade de Santa Luzia (Minas Gerais), foco de atividades liberais durante a Revolução Liberal (1842).

2 Termo relacionado à cidade de Saquarema (Rio de Janeiro), que é conhecida por ter sido centro dos políticos conservadores.

ELEIÇÕES DO CACETE: Depois de assumir o trono em de julho de 1840, D. Pedro II, reconhecendo o apoio dado pelos liberais no Golpe da Maioridade, os convocou para formar o seu primeiro ministério. A partir de então, as rivalidades entre liberais e conservadores começaram a se aguçar, culminando no episódio conhecido como “eleições do cacete”. Convocadas para 1840, as eleições para Câmara dos Deputados, além de darem a vitória para uma maioria liberal, foram marcadas por acusações de fraude e, segundo os conservadores, da aplicação de violência por parte dos liberais, que teriam contratado capangas para intimidar os seus adversários políticos com “cacetadas” nos locais de votação. As acusações dos conservadores geraram resultados. Em 1841, D. Pedro II substituiu o seu ministério liberal por um gabinete majoritariamente formado por conservadores. Vocês imaginam que esse novo ministério conservador pressionou D. Pedro II para anular as eleições de outubro de 1840. Assim sendo, o imperador anulou as eleições e convocou novas eleições para o ano de 1842. Contudo, vocês também supõem que a anulação das eleições causou reações entre os círculos liberais, certo?

REVOLTA LIBERAL: A dissolução da Câmara dos Deputados causou descontentamentos entre os liberais, que viam a medida como inconstitucional e reacionária. Nas províncias de Minas Gerais e São Paulo, onde o Partido Liberal era expressivo, ocorreram movimentos armados que visavam preservar os poderes das elites locais e fortalecer a oposição contra os conservadores. Em São Paulo, o levante foi liderado por Diogo Feijó, limitando-se à cidade de Sorocaba e vilas próximas. Posteriormente, o levante foi sufocado pelo brigadeiro Luís Alves da Lima e Silva, o barão de Caxias (BRASIL MONÁRQUICO, 2017e). Por outro lado, eclodiu em Minas Gerais um levante semelhante ao paulista, sendo liderado por Teófilo Ottoni. Igualmente reprimida pelo Barão de Caxias, a revolta em Minas Gerais não obteve sucesso por conta das dissidências internas, do despreparo das tropas rebeldes e da não adesão de outras províncias à revolta. Depois de derrotar o levante em agosto de 1842, o Império restabeleceu a sua autoridade na província e, em 1844, anistiou os revoltosos.

UMA DISCUSSÃO SOBRE PEDRO II: Considerado como liberal e até mesmo republicano, D. Pedro II tomou, inicialmente, medidas voltadas à centralização e à restauração do poder monárquico3. Por que isso? Seria ele um mentiroso que só queria o apoio dos liberais? Ou será que ele ainda não tinha esses ideais, que só foram sendo criados ao longo de sua maturidade? Ou, ainda, será que nesses primeiros anos a monarquia foi governada por regentes, mesmo o jovem estando no poder? Em resumo, as interpretações associadas às contradições de D. Pedro II – um liberal a favor da escravidão e um monarca com ideais republicanos – ainda estão abertas, cabendo não somente aos historiadores a reflexão sobre esse tema.

3 Para apoiar a reflexão sobre a discussão, ver site:
https://jornalggn.com.br/historia/a-faceta-desconhecida-de-d-pedro-ii/
Acesso em 23 de ago. 2019

PARLAMENTARISMO ÀS AVESSAS: Como vocês devem saber, sistemas de governo parlamentaristas têm, como característica principal, a preponderância do Legislativo sobre o Executivo4. A partir de 1847, foi criado o cargo de presidente do Conselho de Ministros, o que instituiu o parlamentarismo no Brasil5. O presidente do Conselho, por sua vez, era nomeado pelo imperador após a realização de uma eleição entre os líderes do partido vencedor, ficando responsável por montar o gabinete ministerial. Depois de montar o Conselho de Ministros, a Câmara dos Deputados decidia se aprovava (ou não) os nomes escolhidos, cabendo ao imperador demitir ou dissolver o Conselho em caso de reprovação. Para facilitar a compreensão de vocês, leiam o excerto abaixo, que explica um pouco a contradição do parlamentarismo à brasileira:

“Como o poder Moderador não havia sido extinto, o imperador podia impor o gabinete de sua preferência. Essa prerrogativa contrariava os princípios do parlamentarismo, sistema em que o poder Legislativo é quem detém a maior influência na formação dos governos e o monarca reina, mas não governa. Por isso, diz-se que tivemos um “parlamentarismo às avessas” (COTRIM, 2012, p.481).

4 No parlamentarismo, o parlamento que possui a prerrogativa de indicar o primeiro-ministro, chefe de governo e, portanto, comandante do poder Executivo. O monarca – que reina, mas não governa – é o chefe de Estado, mas não de governo.

5 Durante todo o Segundo Reinado, foram 36 gabinetes ministeriais, sendo 21 liberais e 15 conservadores. Entre 1853 e 1861, durante o “período da conciliação”, liberais e conservadores governaram conjuntamente. Apesar do “parlamentarismo às avessas”, o rodízio de poder entre os partidos liberal e conservador causou uma espécie de “ilusão democrática”. Contudo, o imperador, em última instância, ainda acumulava muitas atribuições, inclusive a de dissolver o Conselho de Ministros.

REVOLTA DA PRAIEIRA (1848): Ocorrida em Pernambuco, a Revolta da Praieira encerrou o período de rebeliões provinciais. Contrariados com a nomeação de um presidente conservador para a província, os membros do Partido da Praia – dissidentes do Partido Liberal de Pernambuco – intensificaram a disseminação de suas ideias através do jornal Diário Novo6 e iniciaram a Revolta. Em um documento intitulado Manifesto ao Mundo, os praieiros defendiam: a) voto livre e universal (fim do voto censitário); b) plena liberdade de imprensa; c) extinção do Poder Moderador; d) monopólio do comércio a varejo para brasileiros; e) estabelecimento de uma federação. Sem recursos militares e financeiros, os praieiros não conseguiram resistir às tropas imperiais, que sufocaram a rebelião ainda em 1848. Com isso, o Império reprimiu o último dos levantes regionais, garantindo a unidade territorial e a centralização monárquica.

6 O jornal localizava-se na rua da Praia, em Recife, dando origem ao nome “Partido da Praia”.

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