O nome dado a esse período vem do fato de que as obras eram produzidas, na sua grande maioria, por padres da Igreja católica. Essa escola não era muito distinta da Teologia e seus textos não eram tão sistemáticos e rigorosos como os do período seguinte. As produções desse período não eram feitas apenas para uso acadêmico e eram destinadas a qualquer leitor bem instruído que desejasse se inteirar dos temas estudados, o que tornava a sua leitura mais acessível em comparação aos textos escolásticos.
O principal autor dessa escola é Agostinho, que estudaremos com mais detalhes a seguir. Outro grande autor do período é Boécio (480-525 d.C.), que traduziu algumas poucas coisas diretamente de Aristóteles e também escreveu sobre lógica e sobre filosofia em geral e era, por isso, uma das principais fontes sobre os autores gregos no período medieval. Foi condenado por traição e executado. No período que ficou encarcerado, escreveu sua obra “A Consolação da Filosofia”.
Ainda nesse primeiro momento, durante o período do Império Carolíngio (768 – 814 d.C.), houve um investimento em educação por parte do governo de Carlos Magno. Esse investimento – que gerou um aumento na produção filosófica da época e que, depois, teve impacto no surgimento das escolas catedrais e das universidades – decaiu após o fim desse reinado, gerando um hiato até o período seguinte.
Santo Agostinho viveu entre 354 e 430 d.C. e passou a maior parte de sua vida no norte da África, nas cidades de Tagaste e Hipona (territórios romanos na época e onde, atualmente, se encontra a Argélia). Ele teve contato com textos platônicos e neoplatônicos no período em que esteve em Milão e estes foram de grande inspiração para sua obra. Em 391, Santo Agostinho é ordenado padre na congregação de Hipona e, em 395, se torna bispo. Em suas primeiras obras, ele mostra determinação em compatibilizar as teorias platônicas com os preceitos do cristianismo, porém expressa, nas suas obras posteriores, estar ciente de alguns pontos de extrema incompatibilidade entre eles.

Como a filosofia de Agostinho é inspirada em Platão e nos neoplatônicos, a distinção entre os conceitos de sensível e de inteligível é muito importante para o autor e impacta suas respostas para diversos problemas filosóficos e teológicos. Relembrando as ideias platônicas do capítulo sobre Sócrates e Platão, perceba que a inspiração de Agostinho é a “Teoria das Ideias” de Platão. Vamos ver como ele tenta compatibilizar essas idéias com os preceitos cristãos:
Para Agostinho, o homem é composto de corpo e alma. O corpo pertence ao reino do sensível e é governado pela alma. Através da alma e do uso da razão, o homem pode acessar o reino do inteligível, que deve ser entendido como os conhecimentos e objetos que são acessíveis pelo intelecto, pela razão e pela alma.
As coisas sensíveis são individuadas, privadas e isoladas. Elas estão sujeitas aos efeitos da temporalidade, portanto, são transitórias e perecíveis. Já as coisas inteligíveis são públicas e podem ser simultaneamente conhecidas por todos. Elas não ocorrem no tempo e sua realidade é permanente e atemporal. Os conhecimentos divinos, por exemplo, estão todos no reino do inteligível e são acessados através da razão e da alma.

Um problema central na obra de Santo Agostinho é a sua tentativa de responder como é possível que exista o mal no mundo se a natureza de Deus, que criou tudo, é bondosa e amorosa. Como Deus poderia ter criado algo contrário a sua natureza? Como Agostinho irá responder a essa incompatibilidade?
Para Agostinho, o sensível não é considerado como o mal em si. O mal, segundo o autor, não é um ser ou uma coisa, mas um mau funcionamento da nossa vontade que ocorre a partir da nossa condição de percepção do mundo. A condição humana (ser composto por mente e corpo) nos faz propensos a perceber as coisas materialmente e, sem o uso da razão, somos inconscientes de que o mundo sensível é apenas uma parte de um grande todo que compõe a verdade.
A vontade do homem pode se guiar tanto por desejos e apetites, como os animais, quanto pela razão, que é a melhor forma de governar a vontade, segundo Agostinho e os platônicos. Quando o homem é inconsciente da existência da realidade inteligível, a sua vontade é guiada apenas pelo desejo de objetos sensíveis e transitórios, em um domínio moralmente perigoso para ele. Através da razão, o homem é capaz de acessar o reino do inteligível, das verdades divinas, e de se guiar por elas. O mal moral é, portanto, a vontade humana que persegue os objetos materiais como se fossem bens divinos. O mal é a moral que acredita que os bens menores são os maiores. Dessa forma, o mal não é uma coisa que existe em si mesma e não depende da criação de Deus, logo, não há mais o problema de incompatibilidade que parecia haver quando essa pergunta foi formulada.
Agostinho também escreveu um livro sobre política, “A Cidade de Deus”, como uma resposta a questões práticas de seu tempo. Em 410, Roma foi saqueada pelos visigodos. Na época, muitas pessoas justificaram que o ataque foi um castigo divino por parte dos deuses romanos, insultados com a modificação da religião romana politeísta pela religião cristã. A primeira parte da obra se ocupa em contra-argumentar essas afirmações e a segunda expõe a crença que Agostinho defende; ele procura justificar que esse ataque não foi obra de algum deus pagão e busca fortalecer a crença no deus cristão. Para Agostinho, a história humana está dividida em um conflito entre a Cidade de Deus, cidade de pessoas que contemplam a Deus e vivem em função Dele, e a Cidade Terrena, composta por pessoas que vivem em função de prazeres e cuidados do mundo sensível, conflito no qual deverá vencer a última.