Para começarmos a responder às muitas perguntas que estão em aberto até agora, podemos dizer que música e poesia, assim como a liberdade e o tempo, estão entre aquelas coisas que nós reconhecemos pela experiência. A Estética é a área da Filosofia que se ocupa, especificamente, da experiência artística. A arte é, portanto, uma experiência, no sentido de que experimentamos, por meio dos sentidos, algo. Mas algo o quê? Parece haver uma grande profusão de sensações oferecidas pela arte, desde a experiência da mais cuidadosa harmonia das formas na estatuária grega até a experiência do assustador e do vil nas figuras grotescas da Idade Média.

É interessante observarmos, para o esboço inicial de um conceito de arte, que, embora a experiência estética possa contemplar tanto a ternura do amor familiar, a graça do amor romântico, o riso das comédias ou o desespero dos dramas, o que há em comum a todas essas experiências é o fato delas serem ofertadas por meio de símbolos.
Antes de seguirmos para o próximo conteúdo, em que vamos estudar alguns conceitos históricos envolvidos nas discussões filosóficas sobre a arte, vale retomar as questões iniciais deste conteúdo. A diferença marcante entre os poemas apresentados nos serviu para buscarmos um esboço de definição do que seja arte, algo de comum que permaneça diante de tantas diferenças, a experiência por meio de símbolos e metáforas. Mas a filosofia da arte não se ocupa apenas de definir a arte e seus gêneros. Ela desempenha um papel fundamental no estudo de nossa relação pessoal com a arte, por isso é importante termos em mente aquelas perguntas sobre música.
Quando você diz: “esta música é boa” e seu amigo discorda de você, a discussão pode não acabar nunca. Mas, se você disser algo como: “este carro é bom” ou “esta cidade é boa”, seu amigo pode até discordar, mas o caminho para resolver a disputa parece mais ou menos óbvio.
O que está em jogo quando você diz que um carro é bom? Ora, você pode estabelecer vários critérios que são factuais: desempenho, economia, conforto, segurança. No caso da discussão sobre a cidade ser ou não boa, os critérios também vão aparecendo naturalmente. Note que vocês podem terminar a discussão sem convencer um ao outro, mas apenas porque o peso que vocês atribuem a cada critério é diferente. Você pode achar que a potência do carro é mais importante para definir o que é um carro bom para você do que o consumo de combustível, por exemplo, ou, então, você pode achar que a tranquilidade e a segurança de uma cidadezinha do interior são critérios mais decisivos do que a diversidade de lojas, shoppings e cinemas dos grandes centros. Mas ninguém em sã consciência vai negar que a oferta de atividades em São Paulo seja maior que a da pequena Vila Lângaro, no interior do Rio Grande do Sul.

Mas, quando você diz que uma música é boa ou não, os elementos que compõem seu juízo não são da mesma natureza que os elementos que compõem um juízo sobre a qualidade de um carro, de uma cidade, etc. Agora perceba que se você incluir na conta da qualidade de um carro ou de uma cidade elementos artísticos, como design e arquitetura, a discussão começa a ficar mais complicada de novo.
Pode-se dizer que, quando emitimos um juízo do tipo: “esta música é boa”, estamos dizendo mais sobre nós mesmos do que sobre o objeto em si, a música. Você pode ouvir uma pessoa mais velha dizer que “não se faz mais música boa” e saber que isso não contradiz todas as pessoas que dizem “esta música é boa” para as músicas de agora. Isso se explica através de uma relação afetiva, própria da arte, que mantemos com certas canções, pois elas nos remetem a determinados momentos e experiências de nossas vidas. A música, muitas vezes, nos remete a essas experiências. A arte, por sua natureza sensível e emocional, se presta muito a servir como âncora e referência de lembranças, sentimentos e sensações. Ainda que você seja um músico com grande formação técnica e possa, por critérios objetivos, qualificar uma música como menos original ou inventiva em relação a outras, isso não impede que você considere maravilhosa uma música não muito sofisticada, pois ela, de certa forma, tem uma importância emocional para você.