Poesia Marginal/Geração Mimeógrafo

Para falar de Ana C., precisamos mencionar a poesia marginal ou a geração mimeógrafo, que surgiu na década de 70 no Brasil. Geração mimeógrafo, pois os escritores que aderiram a esse grupo não se utilizavam dos meios tradicionais de circulação de obras, ou seja, não eram publicados por meio de editoras. Esses autores publicavam seus próprios livros, divulgavam e os vendiam, ficando, dessa forma, às margens do sistema editorial. E por que eles faziam isso?

Um dos motivos era o contexto de repressão e de censura à arte que havia na época da ditadura militar. Então, essa atitude era uma forma de escapar da censura.

Ana C. vivenciou essa lógica de trabalho. Seus três primeiros livros – Cenas de Abril, Correspondência Completa e Luvas de Pelica – são edições artesanais feitas pela própria autora.

O seu primeiro livro publicado por uma editora foi A Teus Pés, em 1982.

Ler Ana C. não é tarefa fácil, mas é uma experiência recompensadora. Quando a gente lê os poemas e os textos da autora, quando a gente lê poesia de forma geral, fica uma importante dica para vocês: não se preocupem em entender racionalmente tudo, não se preocupem em decodificar, em traduzir tudo, em querer interpretar cada palavra. Lembre-se do que disse Waly Salomão sobre a arte e não sejam demasiado racionais. Apreciem a linguagem, sintam a linguagem! As palavras da poesia emitem sons bonitos mesmo quando a gente não consegue captar tudo que está dito. Quando a gente fala de arte, é mais importante SENTIR do que ENTENDER.

Por fim, Ana Cristina César – essa complexa e misteriosa poeta – nos deixou mais um mistério. Jovem, aos 31 anos, suicidou-se ao se jogar da janela de seu quarto, na casa dos pais, no Rio de Janeiro.

Pausa Para a Poesia?

Nada, esta espuma

Por afrontamento do desejo
insisto na maldade de escrever
mas não sei se a deusa sobe à superfície
ou apenas me castiga com seus uivos.
Da amurada deste barco
quero tanto os seios da sereia.

(CÉSAR, Ana C. Inéditos e Dispersos. IMS, 1998)

Fisionomia

Não é mentira
é outra
a dor que dói
em mim
é um projeto
de passeio
em círculo
um malogro
do objeto
em foco
a intensidade
de luz
de tarde
no jardim
é outra
outra a dor que dói

(CÉSAR, Ana C. A Teus Pés. São Paulo: Companhia das Letras, 2016)

Para saber mais, veja também: