Pleiotropia, Interação Gênica e Cromossomos Sexuais

Quando um par de alelos, sob determinadas condições ambientais, está relacionado com dois ou mais caracteres, falamos em pleiotropia. Quando vários pares de genes interagem para a determinação de apenas um caráter, chamamos de interação gênica. E ao estudarmos a herança de características ligadas ao sexo, falamos em cromossomos sexuais.

Pleiotropia

Na pleiotropia, um gene afeta várias características. Este processo ocorre na maioria dos casos de herança genética. A fenilcetonúria, doença de caráter recessivo, pode ser usada como um exemplo. Esta doença se caracteriza pela incapacidade do organismo em expressar a enzima fenilalanina hidroxilase (expressa por um par de alelos específico), responsável por transformar o aminoácido fenilalanina em tirosina. Esta deficiência, quando não tratada corretamente, pode acarretar em diferentes fenótipos clínicos, como lesões no sistema nervoso central (formação deficiente de mielina), redução dos níveis de serotonina, o albinismo (bloqueio da produção de melanina), o cretinismo (retardo do desenvolvimento geral pela deficiência da produção da tiroxina — hormônio da tireóide), baixos níveis de adrenalina, entre outros sintomas.

A doença de Gaucher e a galactosemia também são exemplos de doenças nas quais a deficiência de uma enzima (expressa por um par de alelos) implica em diversos fenótipos (caracteres).

Interação Gênica

São os casos em que vários pares de genes interagem para a determinação de apenas um caráter. Existem vários casos de interações gênicas, que podem ser agrupados em duas categorias: interações epistáticas e interações não-epistáticas. É chamada de Epistasia quando um gene inibe a ação de outro gene não-homólogo. O gene que inibe é chamado de gene epistático e o que é inibido é chamado de hipostático. Nas interações não-epistáticas, os alelos de lócus diferentes interagem na determinação de um só caráter.

Epistasia Dominante

O alelo dominante de um par inibe a ação de alelos do outro par. Um exemplo de epistasia dominante é a herança da cor dos pelos de cavalos, que depende, entre outros fatores, da ação de dois alelos: W e w, e B e b. W (dominante) inibe a manifestação de cor, enquanto o alelo w a permite. O efeito destes alelos influencia a manifestação dos alelos B (determina pelos pretos) e b (pelos marrons). A proporção fenotípica do cruzamento entre diíbridos é 12:3:1.

Epistasia Recessiva

Um par de alelos recessivos inibe a ação de alelos de outro par. A cor dos pelos de cães labradores é um bom exemplo: o alelo dominante B codifica o pigmento preto e o recessivo bb, o pigmento marrom. Alelos de outro lócus interferem na deposição do pigmento produzido: o alelo dominante E permite a deposição do pigmento no pelo, enquanto o recessivo e a impede. A presença de dois alelos recessivos ee no genótipo mascara a expressão dos alelos que determinam a cor do pelo – preto ou chocolate. Nesse caso, surgem cães com pelos amarelos. Proporção fenotípica do cruzamento entre cães diíbridos: 9:3:4.

Epistasia Recessiva Duplicada

Ocorre quando um par de alelos recessivos (aa) inibe a ação de alelos de outro lócus gênico (B e b) e, ao mesmo tempo, o par de alelos bb também é capaz de inibir o par de alelos A e a. Assim, o par de alelos aa é epistático sobre B e b, e o par bb é epistático sobre A e a. Nesse caso, quando ocorrerem no genótipo os pares aa e/ou bb, os fenótipos serão iguais. Quando dois dominantes estão presentes juntos (A_B_), eles se complementam, produzindo outro fenótipo. A proporção fenotípica esperada do cruzamento entre diíbridos é 9:7.

Interações Não Epistáticas

Os alelos de lócus diferentes interagem na determinação de um só caráter. Um exemplo é a determinação da cor de pimentão. Há quatro cores possíveis: vermelho, marrom, amarelo e verde. Essas cores dependem da interação entre alelos de dois lócus gênicos:

O alelo dominante R produz pigmento vermelho e o recessivo r não produz pigmento;

► O alelo dominante C provoca a decomposição da clorofila e o recessivo c permite que a clorofila se mantenha.

Dessa forma:

Pimentões vermelhos ocorrem em plantas com genótipo R_C_;

Pimentões marrons ocorrem em plantas com genótipo R_cc;

Pimentões amarelos ocorrem em plantas com genótipos rrC_;

Pimentões verdes ocorrem em plantas com genótipo rrcc;

Proporções fenotípicas esperadas entre diíbridos: 9:3:3:1

Herança Quantitativa/ Poligênica/ Poligenia

Ocorre quando vários pares de genes interagem para determinar uma característica, cada um com efeito aditivo sobre o outro. Graças a esse tipo de interação existe uma variedade muito grande de fenótipos e genótipos para algumas características. A interação desses fenótipos com o ambiente aumenta ainda mais essa variação, como é o caso da cor da pele, cor dos olhos, altura das pessoas, entre outros.

No caso da herança da cor da pele, existe um modelo simples que propõe a existência de dois genes, cada um com dois alelos. Um dos alelos de cada par seria mais ativo na produção de melanina (A e B); o outro alelo, menos ativo na produção de melanina, é representado pela letra minúscula (a e b). A interação entre esses genes produziria, pelo menos, cinco fenótipos básicos (com branco em um extremo e negro no outro). Outros modelos admitem a existência de pelo menos três genes de efeito aditivo, o que produziria não cinco, mas sete classes fenotípicas.

Cromossomos Sexuais e a Determinação do Sexo

Até este momento, estudamos a herança de características ligadas aos cromossomos autossômicos. Os genes que se encontram em cromossomos sexuais possuem um padrão de herança diferenciado. Antes de entendermos este mecanismo de herança, devemos compreender os mecanismos de determinação do sexo em animais. São eles os sistemas XY, X0 e ZW; e os sistemas que envolvem, além de cromossomos, fatores ambientais (temperatura, disponibilidade de alimentos, etc.).

Sistema XY: o sexo da fêmea é definido pela presença de dois cromossomos sexuais iguais e o macho, pela presença de dois cromossomos sexuais diferentes. Este tipo de herança é comum em mamíferos e em insetos. As fêmeas são homogaméticas, ou seja, produzem apenas gametas que portam o cromossomo sexual X. Os machos são heterogaméticos, produzem tanto gametas com o cromossomo sexual X, quanto gametas com o cromossomo sexual Y. Fêmeas apresentam, na interfase, um cromossomo sexual X condensado (inativo) para compensar a sua ocorrência em dose dupla. Este cromossomo condensado apresenta-se ao microscópio como um corpúsculo intensamente corado e é chamado corpúsculo de Barr ou cromatina sexual.

Sistema X0: machos representam o sexo heterogamético, pois produzem dois tipos de gametas quanto ao cromossomo sexual (um com o cromossomo X e outro que não apresenta o cromossomo sexual – 0). Esse sistema ocorre em alguns insetos, como gafanhotos, percevejos e baratas.

Sistema ZW: as fêmeas são o sexo heterogamético (ZW), pois apresentam dois cromossomos sexuais diferentes. Este é o caso das mariposas, borboletas, alguns peixes e várias aves e anfíbios.

Sistema de Determinação de Sexo Independente de Cromossomos Sexuais

O número de conjunto de cromossomos (diploidia ou haploidia) pode determinar o sexo, conforme o que ocorre em abelhas, formigas e algumas vespas. Entre as abelhas, os óvulos fecundados (2n) podem originar operárias (estéreis) ou a rainha (fértil), dependendo da quantidade e da qualidade de alimento disponível para o desenvolvimento das larvas. O caráter fertilidade está, portanto, ligado a fatores ambientais. Os machos (n) são férteis e produzem espermatozoides por mitose.

Entre répteis, como crocodilianos e a maioria dos quelônios, a temperatura é responsável por determinar o sexo do filhote. Em lagartos e jacarés, temperaturas mais baixas determinam fêmeas, enquanto em quelônios, temperaturas mais altas determinam as fêmeas. É importante considerar que a diferença de temperatura que leva a ocorrência de um sexo é pequena, da ordem de 1oC a 2oC.

Genes Localizados nos Cromossomos Sexuais

Na meiose, ocorre emparelhamento de todos os cromossomos, inclusive os sexuais. Considerando o sistema XY, em função de os cromossomos sexuais possuírem formas e tamanhos diferentes, seu emparelhamento é parcial. Podem-se distinguir assim, duas regiões nesses cromossomos, em função do emparelhamento nas células masculinas: a região homóloga (onde há emparelhamento entre X e Y) e a região não-homóloga (onde não há emparelhamento entre o cromossomo X e o Y).

Os genes que se encontram na região não homóloga do cromossomo X apresentam um tipo de herança chamado de herança ligada ao sexo ou herança ligada ao X. Estes genes sempre se expressam em machos, já que eles são hemizigóticos para estes genes (possuem apenas um alelo). Fêmeas, por possuírem os dois cromossomos sexuais completamente pareados, apresentarão o fenótipo dependendo da relação de dominância existente entre os alelos homólogos (podem ser homozigóticas ou heterozigóticas).

O cromossomo Y humano tem pouquíssimos genes, e os que estão localizados na região não homóloga do cromossomo Y são chamados genes holândricos e condicionam herança restrita ao sexo ou ligada ao Y. A parte do cromossomo Y que influencia o desenvolvimento de machos corresponde ao gene SRY.

Herança Ligada ao X

A herança ligada ao X é aquela em que os genes localizados no cromossomo X não têm alelo correspondente no cromossomo Y. Nesse tipo de herança, as fêmeas apresentam três genótipos (carregam dois X, podendo ser homozigóticas dominantes, recessivas ou heterozigóticas) e o macho apresenta apenas duas possibilidades, pode ter um alelo dominante ou um recessivo no X. São heranças ligadas ao X:

Daltonismo: indivíduos daltônicos não conseguem distinguir o verde do vermelho. Esta condição é determinada por um alelo recessivo (d). Para que fêmeas apresentem daltonismo, elas precisam ser homozigóticas recessivas, enquanto que para o machos, basta apenas um alelo d. Desta forma, a freqüência de machos daltônicos é maior que a de fêmeas daltônicas na população humana.

Hemofilia A: esta característica recessiva acontece em função da ausência de proteínas coagulantes no sangue, o que deixa o indivíduo propenso a hemorragias intensas.

Distrofia muscular progressiva do tipo Duchenne: determinada pelo alelo recessivo (Xd), esta anomalia é caracterizada pela destruição progressiva da musculatura esquelética e leva o indivíduo à morte.

Cromatina sexual e herança ligada ao X: fêmeas heterozigóticas para anomalias ligadas ao X podem conter algumas células com um X ativo, portador do alelo dominante, ficando com o outro cromossomo X, portador do alelo recessivo, condensado na forma de cromatina sexual (inativo). O contrário pode acontecer em outras células do corpo, formando um “mosaico”. A inativação do cromossomo X é aleatória. No caso da distrofia muscular progressiva, fêmeas com 50% das células cujo Xd está ativo apresentam fenótipo normal.

Herança Ligada ao Y

Dizemos que uma herança é restrita ao sexo quando está relacionada ao cromossomo Y na sua porção não homóloga ao cromossomo X. É restrita porque só ocorre em machos, visto que as fêmeas não possuem cromossomo Y. Quando os genes estão localizados na região não homóloga do cromossomo Y, estamos falando de características exclusivas de machos: formação e funcionamento dos testículos. A parte do Y que condiciona o desenvolvimento de machos corresponde ao gene SRY (sex determining region of the Y – região do Y que determina o sexo), responsável pela produção de uma proteína que desencadeia o processo de masculinização, aparentemente ativando genes em vários cromossomos. Em seguida, há produção de testosterona pelos testículos, entre outras substâncias.

Herança com Efeito Limitado ao Sexo

Este tipo de herança ocorre quando o gene está presente em ambos os sexos, nos cromossomos autossômicos, mas se expressa apenas em um deles, como por exemplo, em função da influência de hormônios sexuais. A hipertricose auricular (excesso de pelos na orelha) é um exemplo de doença ligada a genes autossômicos que se manifestam apenas em machos. Algumas vezes, o exemplo da hipertricose auricular é dado por herança restrita ao sexo, entretanto, como algumas fêmeas possuem a característica, isto está sendo revisto.

Herança Influenciada Pelo Sexo

Esta herança se caracteriza pela variação de dominância e recessividade de alelos em função do sexo do indivíduo. A calvície, por exemplo, é determinada por um alelo C1, dominante em homens e recessivo em mulheres.

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