O movimento da poesia concreta foi um divisor de águas dentro do contexto da poesia brasileira. Questionou o que ainda não havia sido questionado, pensou o que ainda não havia sido pensado.
Pensem, por exemplo, nessas palavras que vocês estão lendo. Traços negros posicionados de uma determinada forma nesta página em branco. Ao ler, vocês já pensaram sobre isso? Sobre o porquê de as palavras estarem assim alinhadas na maior parte dos textos que lemos? Qual o papel do espaço em branco que abriga estas palavras que vocês estão lendo? Sim, são convenções! Mas por que respeitamos essas convenções?

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Data de acesso: 26/09/2019
A Poesia Concreta começou a olhar para a maneira como as palavras são escritas, posicionadas na folha, e começou a brincar com elas ou subvertê-las. O poema concreto não pensa nas palavras somente da forma tradicional, ele as usa como imagens, como desenhos, como mensagens.
Num dos poemas mais famosos dos concretistas, temos essa brincadeira. Lixo escrito com luxo. Qual seria a relação entre luxo e lixo é o que o texto de Augusto de Campos faz com que nos perguntemos.
A poesia concreta é uma poesia de vanguarda, ou seja, à época que foi produzida estava muito à frente de seu tempo. Se hoje é comum vermos textos literários que brincam com o espaço em branco da página, que misturam literatura e artes visuais, isso se dá naturalmente graças a primeira ruptura feita pelas Concretistas na década de 1950.
A poesia concreta é assim chamada devido ao seu caráter visual que não ignora o suporte (espaço da folha, posição das palavras) com o qual os textos são escritos e elimina o verso, usando o espaço em branco da página para dispor as palavras de maneiras muito incomuns até então. Uma poesia que é verbal – porque não abre mão das palavras para comunicar – e que é, também, visual. Esse tipo de poesia surgiu no Brasil, tendo sido nomeada pelo poeta Augusto de Campos, em 1955, em uma revista chamada Noigrandes. A poesia concreta se dá a ver oficialmente a partir de 1956 na Exposição Nacional de Arte Concreta que aconteceu no Museu de Arte Moderna de São Paulo.
O primeiro manifesto que vai lançar as bases do movimento concretista é o “Plano-Piloto para Poesia Concreta”, publicado em 1958 e escrito pelos poetas Augusto de Campos, Haroldo de Campos e Décio Pignatari, que já se constituíam como um grupo desde 1952.
No Plano-Piloto, os autores definem o espaço como um agente importante no qual a poesia pode ser feita. As palavras saem de suas linhas, de suas margens, de suas prisões. O espaço passa a ser matéria de poesia.
Trecho do Plano-Piloto para Poesia Concreta:
“(…) poesia concreta: produto de uma evolução crítica de formas dando por encerrado o ciclo histórico do verso (unidade rítmico- formal), a poesia concreta começa por tomar conhecimento do espaço gráfico como agente estrutura. espaço qualificado: estrutura espácio-temporal, em vez de desenvolvimento meramente temporístico-linear, daí a importância da ideia de ideograma, desde o seu sentido geral de sintaxe espacial ou visual”.
Disponível em: http://tropicalia.com.br/leituras-complementares/plano-piloto-para-poesia-concreta Acesso em 18 de abr. 2019
Trecho de Nova poesia: concreta (manifesto) por Décio Pignatari:
a palavra tem uma dimensão GRÁFICO-ESPACIAL
uma dimensão ACÚSTICO-ORAL
uma dimensão CONTEUDÍSTICA
[…]
o POEMA CONCRETO aspira a ser: composição de elementos básicos a linguagem, organizados ótico-acusticamente no espaço gráfico por fatores de proximidade e semelhança, como uma espécie de ideograma para uma dada emoção, visando à apresentação direta – presentificação do objeto.
[…]
a POESIA CONCRETA é a linguagem adequada à mente criativa contemporânea permite a comunicação em seu grau + rápido.
Disponível em: http://www.poesiaconcreta.com.br/texto_view.php?id=7 Acesso e 18 de abr. 2019
Observem a disposição das palavras, as palavras em caixa-alta. Foi dessa maneira que Décio Pignatari escreveu seu texto, colocando em prática a ideia da dimensão gráfico-espacial das palavras.