Lipídios

Esse grupo de biomoléculas é, assim como o dos glicídios, muito amplo: engloba todas as gorduras existentes na natureza, de origem animal e vegetal (note que termo “lipos”, de origem grega, significa gordura). Nós sabemos diferenciar os lipídios de outras espécies químicas mesmo não tendo a disposição um instrumento de análise química, quer ver?

Os lipídios são substâncias untuosas ao tato, insolúveis em água (e solúveis em solventes orgânicos, ou seja, lipossolúveis) e provocam manchas características em tecidos e em papéis (as famosas “manchas de gordura”, de difícil remoção). Isto é, têm propriedades organolépticas -que podem ser percebidas pelos sentidos humanos – em comum. Mas o que será que as confere estas características?

Primeiramente, os lipídios podem ser divididos entre lipídios simples e lipídios complexos.

► Os lipídios simples são ésteres formados a partir da condensação de ácidos graxos e os mais variados álcoois.

► Já lipídios complexos compreendem outras estruturas moleculares, frequentemente cíclicas.

Tanto lipídios simples quanto complexos possuem papel biológico importante, como analisaremos a seguir. Estudaremos a seguir as classes mais importantes de lipídios simples, nas quais as substâncias são enquadradas de acordo com sua constituição química.

Ceras

Essa classe de lipídios simples é formada pela condensação de álcoois de cadeias longas (também chamados álcoois superiores) com ácidos graxos. Nessa reação, ocorre também a liberação de uma molécula de água, por isso, ela é também chamada de desidratação. As ceras podem ser encontradas na natureza em vegetais e em animais. Na indústria, são usadas na fabricação de vernizes, graxas para sapato, velas, medicamentos, entre outros.

Glicerídeos

Essa classe de lipídios simples é formada a partir da condensação da glicerina (também chamada glicerol) e 3 moléculas de ácidos graxos. Eles compreendem todos os óleos e gorduras, cuja origem pode ser animal ou vegetal. Como a glicerina possui três grupos (OH)-, os glicerídios são também são chamados de triglicerídeos ou triacilgliceróis:

Note que na reação há também a liberação de 3 moléculas de água (reação de desidratação).

Para saber se o glicerídeo é um óleo ou uma gordura, precisamos conhecer a natureza do ácido graxo que o gerou. Esses compostos são ácidos monocarboxílicos (têm apenas um grupo carboxila em sua estrutura) de cadeia aberta que possuem número par de átomos de carbono (geralmente superior a dez) em sua estrutura molecular. Ácidos graxos podem ser:

a) Saturados: são aqueles que só possuem ligas simples entre os carbonos;

b) Monoinsaturados: apresentam apenas uma liga dupla (também chamada de insaturação) entre os carbonos;

c) Poli-insaturados: possuem pelo menos duas ligações duplas em sua estrutura de carbonos.

Cerca de 90 % dos ácidos graxos encontrados na natureza estão na forma cis. Olha só:

Óleos e Gorduras

De forma abrangente, quanto maior o número de insaturações (ligas duplas) no ácido graxo precursor (ou seja, dos radicais R da figura anterior, que mostra a estrutura geral do glicerídeo), maior a propensão do glicerídeo ser um óleo. Analogamente, a inclinação do glicerídeo a ser uma gordura aumenta conforme a quantidade ácidos graxos saturados (sem liga dupla) em sua molécula.

Lembre-se: enquanto óleos são líquidos à temperatura ambiente, gorduras são sólidas. O esquema abaixo traz alguns exemplos de óleos e gorduras encontrados em alimentos:

Pode-se transformar um óleo em gordura através de uma reação de hidrogenação, que consiste na adição de H2 na presença de um catalisador às ligas duplas de um óleo. Essa gordura formada é então chamada de gordura hidrogenada. Ela pode ser produzida partir de diversos óleos vegetais, como o de soja. Um exemplo de alimento rico em gordura hidrogenada é a margarina, de uso comum em nosso cotidiano.

O processo de hidrogenação, no entanto, nem sempre converte todas as ligas duplas em ligas simples. Nesse caso, parte dos radicais R (aquele ligado ao grupo éster, mostrado na estrutura acima) inicialmente na conformação espacial cis podem mudar para a trans. Essa é a origem da gordura trans, que não existe na natureza.

Note que todos os alimentos industrializados devem ter indicado em seu rótulo a quantidade de gordura saturada e trans que contém – isso é uma norma da Anvisa, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária brasileira. Essa exigência é consequência de muitas pesquisas que mostram que a ingestão de gorduras saturadas, em especial a gordura trans, oferece riscos à nossa saúde. Assim, dedique especial atenção para alimentos como sorvetes, margarinas, alimentos congeladas em geral, biscoitos, salgadinhos e pipocas de micro-ondas: eles possuem alto índice de gordura saturada – e podem ter gordura trans!

No entanto, é importante perceber que nem todas as gorduras são prejudiciais à nossa saúde. Além de serem nutrientes importantes, elas dão também sabor aos alimentos, nos fornecem energia e participam de processos estruturais e hormonais de nosso corpo.

Por fim, vale lembrar que os lipídios são também um meio biológico eficiente para armazenamento de energia a longo prazo (em termos gerais, pode-se dizer que enquanto um grama de açúcar ou proteína metabolizado em nosso corpo gera 4 kcal de energia, um grama de lipídio libera 9 kcal). Por conta dessa propriedade específica, nosso organismo produz o tecido adiposo (também chamado gorduroso) quando ingerimos uma quantidade de alimentos superior à nossa necessidade energética. Ele consiste na reserva de energia para um eventual período de escassez de comida.

Reação de Saponificação

É a reação que ocorre entre glicerídeos e bases fortes sob aquecimento, originando o sabão. Essa reação também gera a glicerina:

Assim, agora sabemos que:

Os sabões são misturas de sais e de ácidos graxos.

O mecanismo de limpeza dos sabões baseia-se na sua estrutura molecular: enquanto a cadeia apolar de um sabão é hidrofóbica (possui aversão pela água), a sua extremidade polar é hidrófila (possui afinidade pela água). Na última sessão deste capítulo (PARA SABER MAIS! :D) tem uma sugestão de site no qual é possível entender melhor esse conceito, beleza?

A glicerina é também um produto da reação de saponificação. Além de ser a precursora dos glicerídeos, ela é usada em cosméticos por conta de sua ação como umectante, ou hidratante, natural.

Produção do Biodiesel

O biodiesel é um combustível obtido a partir de álcoois pequenos (etanol, metanol) e óleos vegetais. O processo de produção do biodiesel é baseado na reação de transesterificação. Genericamente, essa reação ocorre entre um éster e um álcool qualquer, originando outro éster e outro álcool. Quando se visa a obtenção do biodiesel, a reação de transesterificação ocorre entre um triacilglicerol (do óleo de escolha) e o álcool etanol (ou metanol):

Lipídios Complexos

Já lipídios complexos compreendem diversas classes de moléculas, com importante papel biológico para animais e vegetais. Uma classe importante é, por exemplo, a dos fosfoglicerídeos, formados por meio da esterificação da glicerina por ácidos graxos e ácidos fosfóricos. Outra classe também relevante é a dos esteroides, que possuem estrutura cíclica característica e estão presentes em organismos vegetais e animais.

Entre os fosfoglicerídeos, destaca-se a família das lecitinas, que estão presente na gema do ovo, na soja, no cérebro, entre outros. Elas são agentes emulsificantes em alimentos* como a maionese, em que são adicionadas para evitar a separação das gorduras da fase aquosa. Abaixo, é ilustrado um exemplo de molécula de lecitina:

* Lembre-se: emulsão é uma mistura instável entre dois líquidos imiscíveis em que um deles forma finos glóbulos – chamados de fase dispersa – no seio do outro líquido – nomeado fase contínua. O emulsificante é capaz de aumentar a estabilidade da emulsão.

Já entre os esteroides, têm presença fundamental no corpo humano aqueles relacionados ao colesterol. Ele é um dos componentes da membrana de nossas células e origina outros esteroides importantes, como os hormônios sexuais e a vitamina D.

Para saber mais, veja também: