Como se Legitima Um Golpe?
Se considerarmos que Vargas deu um Golpe de Estado e assumiu o poder irregularmente, mesmo promovendo uma revolução no mundo político, como ele conseguiu se sustentar por tanto tempo no poder? É aí que precisamos voltar a falar da crise instaurada em 1929, ou, a Grande Depressão. Lembra que falamos dela no início do capítulo? Pois então, com a crise, o país estava passando por momentos delicados no âmbito econômico. Nosso principal produto, o café, foi desvalorizado, e foi preciso queimar sacos de café em praça pública para que não se perdesse o dinheiro que vinha dele1. Todo um sistema estava desmoronando. E o que é preciso quando uma pátria está em crise? Um salvador da pátria! Sempre, em todos os momentos em que nós vivemos uma crise nacional, surge uma pessoa que se diz o salvador da pátria (lembre que a crise atual do Brasil também tem seus candidatos a salvadores da pátria, nem sempre bem intencionados!).
1 Essa é uma lógica meio complicada de se entender. A queima de café tinha o objetivo de reduzir a oferta do produto no mercado internacional, a fim de evitar uma forte desvalorização do mesmo.
Por isso, é possível dizer que, de modo bem geral, a crise ajudou Getúlio a se manter no poder, porque com um governo forte, centralizado, autoritário e antidemocrático, sem margem para contestações, o Brasil tentou se reestruturar. E a imagem que Getúlio passava para as pessoas era a de um bom homem, que fazia de tudo para os pobres.
É claro que nem todas as pessoas acreditavam nisso! Logo após o golpe de 1930, algumas pessoas dos mesmos grupos que ajudaram a se efetivar o golpe, pediram novas eleições. A situação ficou tão complicada que, em 1932, estourou uma revolta, protagonizada por militares contrários à ditadura de Vargas, chamada de Revolução de 1932, ou, Revolução Constitucionalista. A ideia dos revoltosos, como o nome já diz, era criar uma nova Constituição no país. A constituição vigente até aquele momento era a primeira da República Brasileira, datada de 1891. Passado o calor da revolta, dois anos depois, Getúlio assinou a segunda Constituição Brasileira, agora datada de 1934.

Ainda não era uma Constituição ideal de um governo que se dizia democrático, mas que não aceitava eleições presidenciais. Mesmo assim, depois de uma certa reestruturação econômica, pode-se dizer que o regime ditatorial de Getúlio Vargas se legitimou pela nova Constituição.
Governando Entre Inimigos: Comunistas e Integralistas
A aparência democrática do governo Vargas depois da Constituição de 1934 foi desmascarada um ano depois. Isso porque dois movimentos de oposição ao governo de Vargas tiveram fins arbitrários nos anos que se seguiram à assinatura da Magna Carta2. De um lado, a AIB (Ação Integralista Brasileira) e, de outro, a ANL (Aliança Nacional Libertadora).

2 Outra forma de chamar a “Constituição”, mas mantendo o mesmo sentido, se referindo ao mesmo documento.
O movimento da AIB, também conhecido como Integralismo, tinha sido fundado em 1932, no seio da discussão sobre os rumos do Brasil. Suas pautas se equiparavam às pautas do fascismo. Com uma postura de ultradireita, extremamente nacionalista, e com um espírito mais antidemocrático do que o próprio Vargas, os integralistas tinham na figura de Plínio Salgado seu principal líder. Durante um certo tempo, eles tiveram forte diálogo com o governo Vargas (quando este precisou daqueles), mas, em 1937, num corte profundo e sem piedade, Getúlio Vargas mandou fechar as portas do movimento integralista. Mas não seria a primeira vez que isso acontecia.
Em 1935, Vargas mandou fechar outra organização que servia de contraponto a seu governo, a ANL, Aliança Nacional Libertadora. Formada, principalmente, por membros do Partido Comunista do Brasil (PCB), fundado em 1922, a ANL tinha como pauta principal a derrubada do governo de Vargas para que assumisse um governo mais voltado à esquerda política, preferencialmente Comunista. Depois de acusada de conspirar contra o governo, a ANL foi fechada e seus membros foram presos, torturados e exilados. A figura de Luís Carlos Prestes (que não tinha nenhuma relação com o Júlio Prestes) foi perseguida por Vargas durante alguns anos. Esse episódio ficou conhecido como “Intentona Comunista”.