As Origens do Barroco
Em primeiro lugar, galera, vocês precisam saber que o Barroco foi um movimento artístico-cultural e que ele, de forma alguma, é uma exclusividade do território brasileiro. Muito pelo contrário. Mas vamos por partes!
Para falarmos em Barroco, para entendermos as origens desse movimento, precisamos pensar em um outro movimento artístico-cultural, o Renascimento, que teve origem na Itália e se espalhou pela Europa.
Talvez vocês lembrem que o que marca a cultura renascentista é o fato de essa cultura ter se afastado da ideologia da Idade Média. Temos, nas três primeiras décadas do século XVI, um predomínio da razão sobre o mito e a magia, um predomínio da ação e do pensamento sobre a ordem divina.

A sociedade renascentista passa por um processo de autoestima muito alto. Há uma forte segurança nessa época. Essa segurança de um homem que se sente o senhor do seu destino aparece nas artes e na filosofia, por exemplo. Pensem nas cores claras e nos tons pastéis que vão marcar a arte do período. Pensem na placidez e na segurança do sorriso de Monalisa. Podemos interpretar o sorriso mais misterioso da história da arte através dessa leitura: confiança em si próprio!
Somado a isso, vamos lembrar: O que está acontecendo na Europa em fins de século XV e início de século XVI? Expansão territorial e crescimento econômico. Esse novo quadro no horizonte europeu traz muitas luzes para esse período.
No entanto, no meio de luzes, havia sombras!
Em 1517, temos a Reforma Protestante e, em 1527, as cidades estado italianas, de onde irradia o Renascimento, entraram em decadência! E, aí, a segurança vai indo por água abaixo, a tranquilidade e a placidez vão esvanecendo; a arte harmônica do Renascentismo, cheia de luzes, de harmonia, de formas regulares, vai dando espaço a uma arte obscura, cheia de medos, culpas e inseguranças, e isso vai dando espaço ao surgimento da Arte Barroca!
A Arte Barroca, então, é dicotômica, é uma arte que traz duas visões de mundo opostas em si, a medieval e a renascentista. Tudo isso forma o Barroco, a arte da Contrarreforma. Temos, então, uma arte eclesiástica que irradia valores católicos, trazendo um dilaceramento do homem entre corpo e alma, claro e escuro, liberdade e culpa. Enquanto, por exemplo, o Renascimento valorizava o corpo, a Idade Média valorizava a alma. A arte barroca, então, vai trazer fortemente essa dicotomia entre corpo e alma, a sensação de culpa quando o homem se realiza no corpo, um pensamento que vem lá de Platão e que parte o homem em dois. Separa, erroneamente, o corpo da alma.
A Estética Barroca
O Barroco ganha força na Espanha num período entre 1580 e 1640. A arte barroca vai se espraiar para Portugal, pois o país estava sob o domínio da Espanha (União Ibérica). Nesse período, na Espanha, uma forte religiosidade dominava, o que favoreceu o surgimento e a força dessa arte eclesiástica.
Vamos relembrar a questão da Estética Barroca, focando mais na poesia e na literatura e analisando quais são as características desse tipo de arte.
Para te ajudar a compreender isso, vamos pensar no significado de Barroco. Barroco significa pérola irregular. A poética barroca é completamente exagerada e reproduz um estado de mal-estar do homem, que se reproduz na forma, na linguagem, enfim, na estética. A linguagem barroca é extremamente rebuscada, cheia de antíteses, de paradoxos e de hipérboles. Além de ser extremamente subjetiva!
Barroco no Brasil
A chegada do Barroco no Brasil não é apenas uma transposição cultural das nações ibéricas para a América Latina, e sim uma cópia dos valores artísticos europeus. A literatura “brasileira” do século XVII é uma cópia da literatura portuguesa. Teremos uma cópia dos estilos, da forma e do conteúdo; enfim, uma cópia dos temas da literatura de Portugal. Os escritores dessa época vão se inspirar muito no grande escritor português Luís de Camões.
Da mesma forma que em Portugal e Espanha há um retorno aos valores medievais, aqui, no Brasil, acaba acontecendo o mesmo.
O espírito da contrarreforma no nosso país – apesar de estarmos no século XVII – vem para cá via jesuítas, que aqui, no Brasil, vão tentar espraiar a ideologia católica, especialmente na Bahia, que era a região mais próspera economicamente. Eles vão tentar espraiar esses valores católicos nas Igrejas e, principalmente, nas escolas, pois queriam convencer e evangelizar os jovens.
Mas quais jovens exatamente?
Esses jovens eram as poucas pessoas com condições de estudar no Brasil dessa época, pois eram abastados. E o que os jesuítas pregavam? A lógica de desapego do corpo e maior preocupação com a alma. No entanto, havia uma contradição, porque era comum que jovens filhos dos senhores de engenho abusassem sexualmente de escravas, aproveitando-se de sua força física e de sua posição hierárquica.
Havia, então, a moral dos jesuítas versus o erotismo violento e escondido dos canaviais; moralismo de um lado e, de outro, falta de ética, abuso de poder e crueldade. A negação ao corpo e o moralismo eram duplamente quebrados através da violência das relações senhor-escravo(a). Toda essa realidade vai influenciar na obra de dois autores que, quando se trata de Barroco brasileiro, são nomes obrigatórios: Gregório de Matos Guerra e Padre Antônio Vieira.
Gregório de Matos Guerra

Gregório nasceu em Salvador, em 1633. Ele tinha a alcunha de Boca do Inferno, devido à sua poesia fortemente debochada e satírica.
Gregório estudou no colégio dos jesuítas (olha a influência dos valores católicos aqui!), depois foi para Portugal estudar Direito em Coimbra. Permaneceu em Portugal até se tornar juiz, em 1663. Por volta dos 40 anos, retornou ao Brasil.
Quando voltou, em 1679, ele encontrou a sociedade brasileira em crise; retratou e protestou contra essa realidade através de uma poesia fortemente satírica. Ele chegou a ser considerado um herege pelo Tribunal do Santo Ofício. Apesar de ter escapado da primeira acusação, não escapa da segunda e é desterrado para a África.
Temáticas da poesia do Boca do Inferno:
► Poesia Religiosa
► Poesia Amorosa
► Poesia Obsceno-Erótica
► Poesia Satírica
Imaginem, dentro de uma realidade moralista e cheia de exagero nos valores católicos, o sujeito escrever poesia erótica e satírica, que condena a Bahia, os portugueses, os padres, os colonos (vindos de Portugal para explorar a terra brasileira), e critica a falta de ética e a hipocrisia que imperava. Daí esse apelido de Boca do Inferno.
Padre Antônio Vieira

Outro autor que nos importa conhecer é o Pe. Antônio Vieira, o mestre da palavra ou, ainda, o “Imperador da Língua Portuguesa”, como dizia Fernando Pessoa. Vieira foi conhecido por sua incrível capacidade de argumentação.
Nasceu em Lisboa e, depois de tornar-se Padre, vai fazer parte da Companhia de Jesus, que é a ordem que, em 1549, vem para o Brasil com o objetivo de colonizar e catequizar os índios. Mais ou menos 100 anos depois, Padre Vieira integra essa ordem.
Assim como o Boca do Inferno, Vieira foi um autor extremamente polêmico, pois, em 1652, aqui no Brasil, ele começa a defender abertamente a população indígena, colocando-se em guerra por quase 10 anos contra os colonos escravistas e se posicionando contra a escravização indígena. Os proprietários de terra que se beneficiavam com a escravidão enxergavam em Vieira seu principal inimigo.
Antônio Vieira foi um subversivo, um questionador do status quo, que lutou por questionar uma desumanização que, na época, era vista como natural. Essa foi a principal luta desse autor, que chegou a afirmar que os índios escravizados poderiam ser trocados por escravos africanos para realizar os trabalhos forçados. Contudo, ao ver um escravo africano sendo torturado, o Padre fica completamente horrorizado e passa a ser contra toda a forma de escravidão. Daí o seu caráter subversivo, pois ele está questionando aquilo que dava dinheiro, que movia a economia brasileira.
A literatura de Vieira não era ficcional, isto é, não tinha a intenção de fazer arte! Então, mais uma vez, observem: não temos, efetivamente, nem literatura e nem literatura brasileira nesse contexto, mas um autor que entrou para a história da produção de texto no território brasileiro.
A obra de Vieira é constituída por Sermões, que eram os sermões dados por ele aos fiéis católicos.
Principais temáticas dos Sermões:
► Temas do cotidiano (pegava elementos do cotidiano, juntava às histórias bíblicas e fazia críticas à sociedade da época);
► Temas religiosos (questão da morte X eternidade);
► Questão da escravidão;
► Reflexão sobre como fazer sermões (se os fiéis não praticavam a ética pregada nos textos sagrados, era porque os sermões não os convenciam).